terça-feira, 25 de março de 2025

Voando sobre um ninho fêmeo - Poesia


Copyright: Cecília Barreira, Fevereiro 2019


" Pudesse eu ficar o écran dos teus olhos espelho 

Nãoa têmpora de mãos cheias de raizes, dissoluções e cabelos,

Pudesse eu guardar o teu hálito nos relâmpagos da minha pulsação 

Pudesse eu habitar os mapas dos indizíveis e recriar-te nos círculos 

Pudesse eu passar-me na doçura da tua nuvem interior

E estilar fragmentos de braços e recifes

Pdesse eu recitar as alegorias e baixar ao terrunho

Brevidade, sombras, pães de intensidade,

E não haveria emoção que não se confundisse com o teu sobressalto,

E não haveria o dia e a sonolência,

E não haveria mastros nos versos,

E não haveria a morte na contingência,

E só haveria o ciclone do estio,

E o azul de invisibilidades."


-Sara Rocha Cardoso - administradora do blog 
 

Desvarios e Erros Meus - Poesia

 Este livro, com prefácio de Teresa Lousa, é um conjunto de glosas de poemas de vários autores portugueses. É uma obra "sui generis" da autora, onde ela mergulha no poema original e na maioria das vezes transforma-o de forma genial.





Direitos autorais: Cecília Barreira (2018)

quinta-feira, 20 de março de 2025

20 de Março aniversário da Poeta Cecília Barreira



No dia do seu aniversário natalício, um poema que gosto especialmente e dos últimos escritos por ela, não publicado em livro.
..e contigo nasceu a Primavera 🌸 


 SÃO HORAS DE VOLTAR

"Dei-te a minha fala dei-te as arcas da neve do sol nos moinhos

São horas de voltar

Nos insetos que contemplo guardadora

A fúria do amor

Os vinhos do desejo

As mordidelas sem pejo

Dei-te a minha fala dei-te as arcas da neve do sol nos moinhos

No teu corpo a minha mandíbula curta

São horas de voltar

A música é a doçura do existir

Os meus vidros estão sujos do meu bafo

São horas de voltar

Um epílogo

A invisibilidade dos pés magoados das bailarinas

Devoro o crepúsculo algures numa foto tua

Lavo as omoplatas com que te resguardei no ano passado

São horas de voltar

Meto no bolso um boneco de peluche que me ofereceste

Cartilagem

Unhas crescidas

São horas de voltar

Os muros de uma quarentena no mundo inteiro

Os príncipes encerraram suas funções

As princesas estão enfastiadas em casa

São horas de voltar

Escutando Wagner

Rodopio em ti

Fotos, vídeos, memórias

Rasgar 

Transitar

Figuração

São horas de voltar

Hábito num converso

Sou fusível sou má rês "


|Cecília Barreira| 23.08.2024

segunda-feira, 17 de março de 2025

Cartas BD - POESIA


 Com um magnífico prefácio de Rui Zink, neste livro, Cecilia Barreira recorre a personagens da banda desenhada. Escreve-lhes cartas em tom de poema. Sabemos que os personagens BD tendem a encarar mitos modernos e esses mitos não são mais que pedaços de nós. Um deles, cujo autor do prefácio se refere é Loverboy, ao qual Cecília teve uma das mais improváveis ​​elegias ou uma aparente despedida:

"Adeus, minha cuncubina de mim,
adeus idade da inocência,
filadélfia do meu olhar,
o piano da minha existência 
adeus, Orlando em tudo orlandamente,
adeus pequeno budado meu ser autêntico.
A poesia não é o paraíso, mas pode dar-nos"

Orlando: Virgínia Woolf. O Ser em permanente metamorfose.


CORTO MALTÊS

Sentir tudo absoluto,
até a margem da profunda viagem em ti,
chegar aos lábios,
sombra oscilante, cidade de um outro tempo,
aquele em que te conheci.
Um cristal flutua no meu interior,
e não sei desfazer-se de tal,
onde terei abandonado a paixão?
Talvez nos corredores desta casa, deste quarto,
a tua estranheza, tristeza,
e não sei como lhe abrir o território das sombras,
noites por desvendar,
e tantos poderosos por começar.


Direitos autorais: 2005, Ed. gama



- Sara Rocha Cardoso - Administradora do blog
 

sexta-feira, 14 de março de 2025

7 & 10 - POESIA



É tarde meu amor único
Regresso de ausências, mortes
e cadáveres que nunca resolvi.
A viagem tornou-se a
única forma de medir
a espera.
É tarde meu amor único.
Não sei que solstícios 
passar para entrecuzar
a morte que me preenche.
É tarde meu amor único.
Tanta morte por resolver
no preâmbulo de ousadias.
É tarde, tanto que é tarde meu amor único.




Copyright: Cecília Barreira e Europress (2003)



-Sara Rocha Cardoso - administradora do blog


quarta-feira, 12 de março de 2025

Memórias de uma Deusa do Mar -POESIA


desertaste das estórias muito belas,

gora só te comprazes com as estórias

suavemente em movimento, quase partilháveis

com a morte, a inconsistência, a perda.

bebe-las, separadamente,

na primavera,

enquanto o sono não te desce
 


Habito num deserto,
ao longe vens tu,
sempre ao longe tão perto,
habito num deserto,
e eu só quero o teu olhar,
como a luz num rosto de uma doçura antiga.

Habito num deserto,
um paisagem lenta,
o espreguiçar dos dias,
as noites sem fim.

O teu rosto fragmenta-se
em mil e uma noites
que nunca terei ao teu lado,
amor, sonho de uma lua distante.

Habito no deserto,
onde já não sei para onde vou,
dá-me uma mão,
mesmo que seja para mim 
apontares que o horizonte
é nulo,
e a ausência prolonga
em todas as coisas.
Dá-me a imagem do rosto amado,
e a mão ilusória-
(habito num deserto, 
tão longe de ti, tão perto).

Copyright: 1995 Cecília Barreira
Editora: Amadis




-Sara Rocha Cardoso- Administradora do blog

segunda-feira, 10 de março de 2025

15 Anos de Alguma Poesia -POESIA

Este livro, composto por 75 poemas, em cada um deles mergulhamos numa Cecília adorável, que amava Lisboa e retrata de uma maneira brilhante o espaço que a rodeia e o sentimento que a "consome" nesse presente que é o tempo do livro. Ó presente.



"Tintas. Traços. Túlipas. Moinhos.
Enseadas de um corpo se abrem. Um
cidade longa e a taça onde nos recolhemos. Pouso no mármore. Onde
nos sentamos resta uma acácia, do
outro lado das águas" 



DESLUMBRANTE 

 

Deslumbrante o fragmento da Ilha,

luminosidade descendo em forma de rosto,

calendário de um episódio romântico,  a tua

 imagem, nem desafio, tão submersa no

 fascínio dos sabores da terra. Alguma   

eternidade , os espelhos na contraluz,  a noite 

dilatando-se num monólogo de dunas e 

rotas. Tu, debruçando-te em passos breves,

 ilha amnésica com que te recordo.


 Copyright: 1999 de Cecília Barreira e Europress



- Sara Rocha Cardoso - Administradora do blog


sexta-feira, 7 de março de 2025

a sul da memória - POESIA


 "a sul da memória" 1987, segundo livro de poesia


A sul da memória ainda se reúnem os tempos das colheitas de um outro sentir.
Ofereço-te a cidade que me flutua na quase noite para te ancorar nos braços de uma saliva antiga, aquela com que te sulquei breve, feroz, febril, tanto o ofício de núcleos e explosões me foi dado cativar nos olhos que eram os teus. Hoje é o último dia do sul da minha memória. Imóvel, atravessá-lo-emos, sem que eu perdoe esta saudade regular, eu sei, de objetos quebrados.

Lentas metamorfoses. Últimosul. A memória que um sul de ti se me desprendeu, cinzeladamente.


Direitos autorais de Cecília Barreira e Europress


"Não me lembro dos amigos que partem.

Mas a notícia dos que encontraram ressoa-me"




- Sara Rocha Cardoso - Administradora do blog

EQUINÓCIO DA PAIXÃO

Este pequeno livro de 1990, muito raro (o segundo de poesia de Cecília Barreira, o primeiro foi a Lua Lenta de 1984), é de uma beleza sublim...